Há alguns anos a Receita Federal do Brasil vem implementando políticas na área aduaneira cujo objetivo é ampliar a segurança e a facilitação do comércio exterior. Em 2005, o projeto de Lei n. 6.370, que regulamentou o compromisso assumido pelo Brasil perante a Organização Mundial Aduaneira (OMA) de facilitação da Legislação Aduaneira, previa a criação de dois sistemas: o Siscomex Carga e o Harpia.
O arcabouço legal começou a ser instituído pela MP n. 320, em 2006, que acabou rejeitada pelo Congresso Nacional. Sendo assim, a RFB tratou de realizar as mudanças independentemente de ato legal. Disciplinou o despacho aduaneiro de importação através da IN SRF n. 680/06, instituiu o Siscomex Carga com a IN RFB n. 800/07, que entrou em operação em março de 2008, e, por fim, atualizou e sistematizou a legislação através do Novo Regulamento Aduaneiro estabelecido pelo Decreto n. 6.759/09, que vigora desde fevereiro deste ano.
A expectativa agora se concentra na publicação da IN que implementará o Harpia -Sistema de Gestão de Riscos Aduaneiros. O mecanismo de “inteligência artificial”, através de aplicação de técnicas e conceitos para lidar com grandes volumes de informações, fará a análise de risco aduaneiro a partir da seleção de critérios e atributos mínimos de descrição e identificação de mercadorias a serem informados pelos importadores brasileiros.
Desenvolvido pela Receita em conjunto com o Instituto de Tecnologia Aeronáutica (ITA) e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o Harpia é um conjunto de aplicativos que funcionará em interface com o Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex), que controla todas as operações de importação e exportação do País.
Com todo esse aparato, o governo tem objetivos bastante claros: combater a sonegação fiscal (subfaturamento), elevar a arrecadação, inibir a entrada de produtos falsificados no País, reduzir consideravelmente o tempo médio do processo, flexibilizar as importações e exportações e aperfeiçoar a análise fiscal. Nesse último item, o Fisco pretende reduzir o tempo e o custo de execução de rotinas operacionais, otimizar a alocação da mão de obra empregada em procedimentos fiscais, sistematizar e aperfeiçoar as rotinas de aplicação e execução de procedimentos de controle, e uniformizar o controle de atividades fiscais.
Mas, afinal, em que tudo isso afeta os importadores e os exportadores?
Nesse primeiro momento, o foco do Harpia serão as importações. O controle de exportações deverá ocorrer apenas a partir de 2010. No entanto, as obrigações serão similares.
Caberá às empresas nacionais registrar seus parceiros comerciais estrangeiros e a natureza da operação que realizam. Os importadores e exportadores brasileiros terão de cadastrar seus produtos, corretamente classificados conforme os atributos estabelecidos por Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM). A pré-seleção dos atributos considerados pela Receita em seus estudos foi divulgada em dezembro de 2008.
A princípio a missão parece simples. Mas um olhar mais atento verifica que, de imediato, aumentará a carga de trabalho das empresas para adequar suas operações. E trará algumas necessidades prementes nas áreas de cadastro e TI. As empresas precisarão certificar-se de que a classificação fiscal das mercadorias está correta. Portanto, para efetuar o cadastro de forma precisa, a carga de trabalho de revisão das classificações será diretamente proporcional à quantidade de itens importados e exportados. Outro ponto de gargalo será a adequação de cada item do cadastro de acordo com os atributos das NCMs.
As áreas de TI, por sua vez, terão de ajustar os sistemas da empresa para absorver esta nova carga de dados e manter os cadastros internos em sintonia com os cadastros no sistema Harpia.
Para garantir o controle sobre todo o processo, exportadores e importadores deverão estar alertas ao aumento de risco na operação em caso de mudanças e alterações em seus produtos, se os mesmos não estiverem atualizados/autorizados no Harpia. Qualquer deslize pode paralisar as operações e restringir as possibilidades de aplicação das regras de classificação fiscal.
Haverá um aumento substancial de exposição das operações ao Fisco. As margens de adequação às exigências de alguns mercados ficarão, dessa forma, reduzidas.
É conveniente ainda que seja feita uma revisão, ou pelo menos uma verificação, na forma de geração de Declarações de Importação (DIs) e Registros de Exportação (REs), assim como a distribuição de trabalho junto aos despachantes.
O segmento de TI para comércio exterior é um aliado nesse processo. Em primeiro lugar buscando a melhor solução para adequar os processos das empresas às mudanças propostas pela Receita Federal, desenvolvendo uma solução sistêmica para as demandas geradas pelo Harpia. Em seguida, prevenindo eventuais problemas e adequando os sistemas à nova regra ditada pelo governo, pois haverá mudanças de entrada de dados em documentos como RE, DI, LI (Licença de Importação), entre outros.
Todo o processo exigirá um grande esforço de classificação dos itens nos atributos obrigatórios, uma vez que envolve obtenção prévia de detalhes de todos os produtos importados e atributos diferentes para cada NCM.
Haverá um grande volume de dados a serem inseridos e atualizados e, caso esse procedimento seja manual, acarretará um enorme esforço operacional. O cadastro exigirá atenção redobrada para não gerar discrepâncias entre a descrição interna e os dados informados ao Harpia, que deverão estar sempre atualizados. As companhias terão ainda de garantir a futura integração entre sistema da Receita e o Sistema Público de Escrituração Digital (Sped).
Em resumo, o desafio de importadores (a princípio) e exportadores (posteriormente) é se manterem atentos, desde já, às adequações necessárias para atender a essas demandas sem perder a agilidade do processo como um todo.